Para que os idosos, os marginalizados e as pessoas sós encontrem, mesmo nas grandes cidades, espaços de convívio e solidariedade.
[…] De modo particular, a velhice é um tempo de graça, no qual o Senhor nos renova a sua chamada: chama-nos a guardar e transmitir a fé, chama-nos a rezar, especialmente a interceder; chama-nos a ser solidários com os necessitados… Os idosos, os avós têm uma capacidade particular de compreender as situações mais difíceis: uma grande capacidade! E, quando rezam por estas situações, a sua oração é forte, é poderosa!
Aos avós, que receberam a bênção de ver os filhos dos filhos (cf. Sal 128/127, 6), está confiada uma grande tarefa: transmitir a experiência da vida, a história duma família, duma comunidade, dum povo; partilhar, com simplicidade, uma sabedoria e a própria fé, que é a herança mais preciosa! Felizes aquelas famílias que têm os avós perto! O avô é pai duas vezes e a avó é mãe duas vezes. Nos países, onde grassou cruelmente a perseguição religiosa – penso, por exemplo, na Albânia, onde estive no passado domingo – nesses países, foram os avós que levaram as crianças para ser baptizadas às escondidas, foram os avós que lhes deram a fé. Valentes! Foram valentes na perseguição e salvaram a fé naqueles países!
Mas, nem sempre o idoso, o avô, a avó, tem uma família que o possa acolher. E então são bem-vindas as casas para os idosos… contanto que sejam verdadeiramente casas, e não prisões! E sejam para os idosos, não para servir os interesses de outra pessoa qualquer! Não deve haver instituições onde os idosos vivam esquecidos, como que escondidos, negligenciados. Sinto-me solidário com os inúmeros idosos que vivem nestas instituições e penso, com gratidão, a quantos os vão visitar e cuidam deles. As casas para idosos deveriam ser «pulmões» de humanidade num país, num bairro, numa paróquia; deveriam ser «santuários» de humanidade, onde quem for velho e frágil seja curado e defendido como um irmão ou uma irmã mais velha. Faz tão bem ir encontrar um idoso! Olhai os nossos jovens: às vezes vemo-los apáticos e tristes; vão encontrar um idoso e tornam-se alegres!
Contudo há também a realidade do abandono dos idosos: quantas vezes se descartam os idosos com atitudes de abandono que são uma verdadeira e própria eutanásia oculta! É o efeito da cultura do descarte que tanto mal faz ao nosso mundo. Descartam-se as crianças, descartam-se os jovens porque não têm trabalho e descartam-se os idosos sob o pretexto de manter um sistema económico «equilibrado», no centro do qual não está a pessoa humana, mas o dinheiro. Todos nós somos chamados a combater esta venenosa cultura do descarte!
Nós, cristãos, juntamente com todas as pessoas de boa vontade, somos chamados a construir, com paciência, uma sociedade diversa, mais acolhedora, mais humana, mais inclusiva, que não tenha necessidade de descartar quem é frágil no corpo e na mente; mais, uma sociedade que mede o próprio «passo» precisamente por estas pessoas.
Como cristãos e como cidadãos, somos chamados a imaginar, com fantasia e sapiência, os caminhos para enfrentar este desafio. Um povo que não guarda os avós e não os trata bem é um povo que não tem futuro! Porque não tem futuro? Porque perde a memória, e se separa das próprias raízes. Mas atenção! Vós tendes a responsabilidade de manter vivas estas raízes em vós mesmos! Com a oração, a leitura do Evangelho, as obras de misericórdia. Assim, permanecemos como árvores vivas, que, mesmo na velhice, não cessam de dar fruto. Uma das coisas mais belas da vida de família, da nossa vida humana de família, é acariciar uma criança e deixar-se acariciar por um avô e por uma avó. Obrigado!
ENCONTRO COM OS IDOSOS E AVÓS
PAPA FRANCISCO
28 de Setembro de 2014
© Copyright 2014 – Libreria Editrice Vaticana
Comentário
A mesa do avô
[…] «Vivemos numa época em que os idosos não contam. É feio dizê-lo — frisou o Papa — mas são descartados porque incomodam». Contudo, «os idosos deixam-nos em herança a história, a doutrina e a fé. São como o bom vinho envelhecido e dentro de si têm a força para nos deixar uma herança nobre».
A este propósito, o Papa referiu-se ao testemunho de outro grande ancião, Policarpo. Condenado à fogueira, «quando o fogo começou a queimá-lo» — recordou — sentiu-se ao seu redor o perfume de pão cozido. Os idosos são: «Herança, vinho bom, pão bom». Ao contrário, «neste mundo pensa-se sobretudo que eles incomodam».
Aqui, o Pontífice voltou com a memória à sua sua infância: «Recordo que quando éramos crianças nos contavam esta história. Havia uma família, um pai, uma mãe e muitos filhos. E havia um avô que vivia com eles. Mas era idoso e à mesa, quando comia a sopa, sujava tudo: a boca, o guardanapo… não fazia uma linda figura! Um dia o pai disse que, considerando o que acontecia com o avô, a partir do dia seguinte ele teria comido sozinho. Comprou uma mesinha e pô-la na cozinha; assim o avô comia sozinho na cozinha e a família na sala de jantar. Depois de alguns dias o pai voltou para casa e encontrou um dos seus filhos a brincar com um pedaço de madeira. Perguntou-lhe: “O que fazes?”. “Estou a brincar de carpinteiro”, respondeu o menino. “E o que estás a construir?”. “Uma mesinha para ti, para quando fores idoso como o avô”. Esta história fez-me muito bem a vida inteira. Os avós são um tesouro».
Voltando ao ensinamento das Escrituras, a propósito dos idosos, o Papa referiu-se à carta aos Hebreus (13, 7), na qual «se lê: “Lembrai-vos dos vossos guias que vos pregaram a palavra de Deus. Considerai como eles souberam encerrar a carreira. E imitai a sua fé”. A memória dos nossos antepassados leva-nos à imitação da fé. É verdade, às vezes a velhice é um pouco desagradável, devido às doenças que comporta. Mas a sabedoria dos nossos avós é a herança que nós devemos receber. Um povo que não preserva os avós, que não respeita os avós, não tem futuro porque perdeu a memória. Diante do martírio, Eleazar está consciente da responsabilidade que tem em relação aos jovens. Pensa em Deus, mas também nos jovens: “Devo dar o exemplo de coerência aos jovens até ao fim”».
«Far-nos-á bem pensar nos numerosos idosos e idosas nas casas de repouso e também naqueles que — esta palavra é feia, mas digamo-la — são abandonados pelos seus entes queridos», acrescentou o Santo Padre, recordando que «eles são o tesouro da nossa sociedade. Oremos por eles para que sejam coerentes até ao fim. Este é o papel dos idosos, este é o tesouro. Oremos pelos nossos avós que muitas vezes desempenharam um papel heróico na transmissão da fé em tempos de perseguição». Sobretudo no passado, quando os pais e as mães muitas vezes não ficavam em casa ou tinham ideias estranhas, confundidas por ideologias em voga naquela época, «eram precisamente as avós que transmitiam a fé».
MEDITAÇÕES MATUTINAS
PAPA FRANCISCO
19 de Novembro de 2013
© Copyright 2013 – Libreria Editrice Vaticana